quarta-feira, 27 de julho de 2011

FESTA DA UVA OU DO VINHO?

Para 2012 está previsto não só "mais um fim do mundo" (foram previstos vários fins de mundo, em vários tempos e lugares ). Para o próximo ano, estão previstas festividades alusivas aos pretensos 80 anos da Festa da Uva. Como quase sempre ocorre há um equívoco nessa comemoração  .Parte-se do pressuposto que a primeira Festa da Uva ocorreu em 1932. Tal fato parece não se verdadeiro. Antes da década de trinta  ocorreram outras festividades com o mesmo caráter, como a festa das flores, a festa do vinho e as festas dos produtos agrícolas.
Na realidade, há registro de festas realizadas antes daquela data. No quartel ( criado em 1928) foram realizadas pelo menos duas das quais há registro fotográfico, no arquivo do agrupamento.
Enfim, a memória escolhe o passado, não é o passado que escolhe a memória. Também são escolhidos os heróis e os merecedores de títulos e de nomes de ruas e de praças.Em geral são dados a membros de famílias ricas e importantes, muitos dos quais cafajestes da pior espécie,mas que são reverenciados por terem tido acesso ao poder
.As festas dionísicas, das quais  deriva a Festa da Uva  eram em geral realizadas no mes de dezembro nas regiões rurais  e, em fins de  fevereiro  nas regiões urbanas. Observa-se que era o inicio do inverno e inicio da primavera no hemisfério norte
As  festas dionisíacas eram chamadas de Antestérias, literalmente de festa das flores quando  celebradas no final de  fevereiro, marcavam o inicio da primavera.  Em Caxias do Sul, segundo  memórias dos mais antigos, eram celebradas as tais festas já nas primeiras décadas do século XX. Algumas vezes confundidas com o corso carnavalesco, de outra origem e de outro tempo. Dada a mudança de hemisfério, a tradição manteve  a data  mas não a estação. Assim as dionísiacas caxienes que deveriam ser celebradas em setembro  passaram a ser  no inicio do outono, subvertendo  a relação histórica  com a fecundidade e com a reprodução (tanto de  plantas como de animais).
A origem das festas dionisícas  se perdem no tempo.A homérica  bebedeira de Noé (narrada na Biblia) deixa entrever que  erasm  realizadas  entre os judeus.Afirma-se que nasceu na  Lidia , no N. da África , onde também nasceu a moeda. Na verdade as orgias alcóolicas nasceram com a plantação das videiras e as primeiras colheitas da uva e da descoberta do vinho. Datam assim de tempos imemoriais ,onde não havia registro escrito. A foto abaixo foi feita por Vitorio Buccelli, em 1904, quando em visita a Caxias, traz no livro como legenda Festa do Vinho. A Festa do Vinho comemorada pelos colonos é assim anterior e mais significativa que a Festa da Uva. Somente homens da cidade poderiam pensar em comemorações durante a safra. Os colonos não poderiam ( enão podem) participar de festas no auge de seu trabalho. Só nas entresafras é possível festejar e celebrar.




A Festa do Vinho em 1904. Não será ela a primeira Festa da Uva de fato?

segunda-feira, 25 de julho de 2011

PRAÇA DANTE ALIGHIERI E A MAÇONARIA



Esboço do projeto da Praça Dante, Caxias do Sul, com símbolos da Maçonaria
 
Poucos caxienses conhecem a Praça Dante. Alguns a  conhecem de forma superficial:sua forma atual e seus canteiros.Poucos leem o que está escrtito nos monumentos .O traçado da Praça atual mantém os símbolos intocados .
O desenho  da Praça foi traçado em 1928, na administração de Celeste Gobatto(1924-1928). Baseia-se no símbolos sagrados da Maçonaria:o compasso, o triângulo e o olho do "Grande Arquiteto do Universo". Por acaso, o ângulo supeiror do triângulo situa-se defronte da catedral, o olho é representado pelo chafariz. Tais símbolos se repetem no no monumento ao Duque de Caxias. Não se trata de uma coincidência. A Maçonaria foi forte na cidade. Um de seus membros mais importantes foi Joaquim Pedro Lisboa, idealizador da Festa da Uva pós 1930.

domingo, 24 de julho de 2011

DE MUITOS SERVIÇOS

O  texto que segue foi apresentado em Pedavena (Itália) não tendo sido publicado no Brasil.



CONSIDERAÇÕES INICIAIS

São lembranças tristes que quero esquecer. (José Corsetti)

Loraine Slomp Giron*

Em trabalho realizado em 1990, foi feito um levantamento das mulheres proprietárias de terras e de estabelecimentos de indústria e comércio,  no período  compreendido entre 1884 e 1924. Foram listadas  1.515 mulheres registradas nos  livros de lançamentos de impostos pela Intendência de Caxias, como  proprietárias. Essas mulheres  tornaram-se donas da propriedade ou da empresa, na  ausência do marido. Essa ausência foi devida a   três   motivos: viuvez, abandono e incapacidade física ou mental do marido. Foram  33  as mulheres abandonadas pelos maridos, 54 possuíam marido  incapazes, e 1.425 eram viúvas. É possível acompanhar o drama das mulheres abandonadas, viúvas ou com maridos incapazes por meio dos requerimentos encaminhados à Intendência Municipal  de Caxias.
          Por mulheres proprietárias se entende as que respondem por empresas, propriedades ou atividades. As mulheres proprietárias estavam presentes em todos os setores da economia. No setor de serviços, foram registradas 46 no livros de lançamento de Indústrias e Profissões,  no período compreendido entre 1890 e 1925. O objeto desta comunicação  é  a mulher  imigrante, ocupada no setor de serviços, na antiga colônia Caxias, no período de 1890 a 1925, avançando até 1950. A pesquisa foi realizada entre  1990 e 1995. Uma nova pesquisa, iniciada em 2006, permitiu um retorno à zona  rural, buscando verificar  a  influência dos meios de comunicação nesse meio, quando através dela foi possível verificar a participação atual da mulher no trabalho da pequena propriedade. Identificar as diferenças existentes entre a antiga mulher imigrante e a mulher atual  descendente de  imigrantes italianos  fecha a presente reflexão.

COLÔNIA CAXIAS


Demorados e tortuosos são os  caminhos

em minha terra colonial e íntima.( Oscar Bertholdo)

            Colonização foi a forma utilizada pelo Império brasileiro, a partir de 1850, para ocupar os vazios demográficos e as sesmarias abandonadas pelos seus antigos proprietários, através da introdução de imigrantes europeus, visando a instalar no Brasil uma agricultura produtiva e mão-de-obra livre, visto que, até então, vigorava  o trabalho escravo .
            A região escolhida para instalar a Colônia Caxias era dura e agreste, distante dos centros urbanos. A região  da encosta do Planalto Meridional era  desconhecida, até o final do século XIX, pelos habitantes da Província. Nela, viviam de forma temporária nativos, e por ela passavam alguns poucos tropeiros, que, pela estrada Geral, demandavam o vale do Caí. Algumas sesmarias haviam sido concedidas a súditos portugueses, na região, pelo rei de Portugal, mas desses, poucos haviam nelas se fixado, e ela continuava sendo um vazio demográfico. Para reconhecer as terras a serem demarcadas, foi organizada uma entrada liderada por Luís Antônio Feijó   Júnior, em 1870, a  mando do governador da Província do Rio Grande do Sul.
 Foi então iniciada a demarcação das terras, seguida de seu povoamento, que só se tornou  possível  graças à  ação oficial do Império. Somente o poder público possuía os meios necessários para trazer o pessoal técnico necessário para medir as terras, abrir estradas, coordenar a vinda de imigrantes, abrigá-los e assentá-los em seus lotes, dando início ao processo de ocupação das terras. Em 1875, começou o povoamento da região das matas com a chegada dos primeiros  imigrantes europeus, em sua maioria provenientes do Norte da Itália. Os imigrantes vieram em busca de terras para plantar e sustentar a família.
A ocupação  da região das encostas  foi difícil, pois havia  poucas estradas para  ligar    a região a ser colonizada e a capital  da província. Eram primitivos os meios de transporte, apenas os cargueiros podiam vencer as  subidas abruptas e o barro das estradas em tempo de chuva.
         Entre a sede colonial da Colônia Caxias e a capital do e, mediavam 193 quilômetros, sendo 60 Km pelo rio rio Guaíba e Caí e 50 Km  por campos e colinas, e  nada menos de 73  Km que cortavam as matas cerradas. As dificuldades dos caminhos foi uma constante nos relatórios das autoridades italianas  que visitaram a região. Uma viagem de ida e volta entre a Colônia Caxias e Porto Alegre levava, no mínimo, uma semana. Foi o  isolamento das colônias que definiu os   rumos de sua organização e de sua cultura.
            A Colônia  Imperial Caxias fazia parte do sistema de colonização iniciado  pelo governo brasileiro, visando povoar as terras devolutas, como parte da  política de terra, para aumentar a produção agrícola nacional. Eram compostas por 17 léguas em quadro (6.000 metros em quadro) cada uma  légua era dividida em travessões. No centro da colônia, foi demarcada, em 1877, a sede Dante,  que se tornou o centro administrativo e comercial da colônia. Havia 76 quadras. Nelas, foram construídas casas rústicas de madeira falquejada, distribuídas nas quadras reticulares com 90 metros de lado. O centro colonial fervilhava com a chegada de  levas contínuas  de imigrantes, abrigados em um barracão de alvenaria, situado no limite oeste da área urbana.
            O transporte  dos imigrantes da capital a São Sebastião do Caí era feito por vapores e daí, até a sede da colônia, por meio através de  tropeiros. Para o transporte dos colonos,    que era feito por tropeiros, foram  abertas  novas picadas na direção da Terceira Légua e  abertos  novos caminhos que ligavam a sede aos lotes, como a estrada Rio Branco. Em 1884, estava em boas condições  a estrada Conselheiro Dantas, que unia a Colônia Caxias à Dona Isabel e a estrada Rio Branco, que ligava a colônia tanto aos campos de Cima da Serra quanto ao vale do rio Caí.
            Os imigrantes europeus chegados ao Brasil eram  submetidos a contratos assinados entre o governo e as companhias que importavam colonos- futuros compradores das terras devolutas. A colônia começou a ser povoada em 1875, iniciando o povoamento do sul para o norte e de oeste para leste. Forqueta foi a primeira região a ser povoada,  e a Décima Sexta Légua foi a última. Nas colônias do império, não havia fundadores, havia imigrantes pobres que  dependiam da Comissão de Terras para comprar seus lotes e neles ser instalarem. A Comissão de Terras, por sua vez, dependia da Secretaria de Agricultura da Província do Rio Grande o Sul, que estava subordinada ao Ministério da Agricultura do império do Brasil. Observa Costa que “o cargueiro foi o sistema de transporte que, na época, estava ligado a uma profissão, a dos tropeiros ”[1]. Os tropeiros e a estrada Provincial, marcaram a região e transportaram milhares de imigrantes e seus pertences, antes do advento das estrada carroçáveis e das estradas de ferro.
MULHERES E SERVIÇOS
Há nos frutos um gosto do suor da fronte.
(Oscar Bertholdo)


           Dentre os imigrantes vieram mulheres viúvas. Algumas saíram sós da Europa, como  Ana Rech, outras ainda ficaram viúvas durante a viagem, como Maria Segat, outras ficaram viúvas logo após a chegada, como Maria Garbin. As mulheres viúvas receberam lotes, conseguiram pagá-los, bem como os impostos, criaram seus filhos e até casaram novamente. Algumas mulheres foram destruídas pela viuvez. Incapazes de dirigir a propriedade, apelam para a caridade das autoridades. Nos requerimentos, lastimam sua sorte, informam às autoriadades sua incapacidade de dirigir a produção e a propriedade. Há alguns casos, como o de Maria Triches[2] que solicitan a autorização e passa mendigar, conseguindo licença da Intendência. Outro caso é das   Pandolfo [3], as quais, ao ficarem viúvas, não fizeram qualquer tipo de reivindicação. Morreram na mais extrema miséria, incapazes de se sustentar.
            As mulheres abandonadas só o foram, após a  chegada no Brasil. A primeira mulher que assumiu a condição de abandonada pelo marido foi Giovana Perin[4]. O caso de Giovanna é paradigmático em relação à ação das mulheres abandonadas. A história de Giovanna pode ser reconstruída mediante de seus requerimentos. Residia no lote n.º 18, do Travessão Cavour, na nona Légua. Segundo suas próprias  informações,  foi abandonada em 1897. Seu  primeiro requerimento data de 1900,  três anos após o abandono. Informa que tem quatro filhos menores. Com ela  vivem os sogros idosos e incapacitados para o trabalho. Alegando falta de meios para pagar o Imposto Focolar, pede isenção desse tributo. Nos anos subseqüentes, continua solicitando e consegue outras  isenções, como a do Imposto de Conservação e Melhoramentos de Estradas. Num dos requerimentos, observa que sua situação era “pior do que a viuvez”. Ela  sustenta sua família apenas com a força de seu trabalho, pois seus  os filhos menores e os sogros idosos pouco   a auxiliavam  na lavoura. Em 1906, informa que ficou  viúva, assim consegue  nova isenção. Os filhos já estavam maiores, e as condições, menos adversas, suas  queixas  diminuem de intensidade. Mas, sobre as causas do  abandono, nada foi possível levantar. Não se sabe para e onde foi o marido, quando, onde, ou como ele  morreu.
Mais sério que o caso das mulheres abandonadas, total ou temporariamente, é  aquelas que possuíam maridos incapazes física ou mentalmente. A análise das guias de internação de doentes pobres, levados para Porto Alegre, revela números altos de doentes mentais e físicos na região. Através das Guias de Encaminhamento de  1898 a 1908,  foram levantados  172 casos de  doentes com problemas mentais  encaminhados à Santa Casa  e ao Hospício São Pedro. Há mais “loucos”, como são chamados os  doentes, que requerimentos de mulheres. Isso significa que as mulheres, de certa forma, foram tocando seus negócios sozinhas. Um dos casos de loucura do marido foi o de Mariana Mussoi Bascou, que encaminhou requerimentos à Intendência, como proprietária do lote nº 1, Travessão Vitor Emanuel, na sétima Légua. Pediu isenção de impostos e licença para vender frutas na Praça Dante, na vila. A história de Mariana Bascou diverge das outras mulheres proprietárias, pois consegue a interdição do marido além de sua internação definitiva no Hospício São Pedro de Porto Alegre.[5]
Da mesma foram que nem todas as mulheres encaminharam requerimentos à Intendência, a maior parte delas  não se registrou na Intendência, como prestadoras de serviços. Apenas 46 estão inscritas como donas de hotel, parteiras de casas de pasto, proprietários de botequins, carretas e de  tropas. Não se esgotam aí as atividades desempenhadas pelas mulheres imigrantes. Muitas forneciam comida para fora  sem estarem   registradas como donas  de restaurante. Situação idêntica parece ter ocorrido com outras atividades, como a de  parteira. Giuditta Tavernaro, por exemplo, registrada como agricultora, exercia ainda a atividade de parteira, auxiliando vizinhas nos trabalhos de  parto.
            No quadro 1, é possível acompanhar a variedade das atividades do-setor de serviços.

       

Quadro 1: (Ocupação das Mulheres Proprietárias/Serviços_1890-1925)

           


Ano
  1890-
1900
1910
1915
1920
1925
Total
Hotel
-
-
1
2
2
2
9
Casas de Pasto
-
-
2
2
2
2
8
Botequim
-
-
1
4
6
3
13
Carretas
-
-
1
4
-
-
5
Tropas potreiro
_
1
_
2
-
-
3
Parteiras


2
2
2
3
11
Total
0
1
7
16
12
10
46


Fonte: Livro de Lançamento de Impostos de Indústrias  e Profissões.

Pelos requerimentos, observou-se que as mulheres desempenhavam outras atividades, mas que não foram registradas. Algumas “despachantes” escrevem requerimentos às mulheres analfabetos, assinando a petição, mas disso não há registro nos livros de lançamento. No decorrer do tempo, há uma certa especialização dos serviços femininos. Aumenta o número de parteiras, de modistas e de  donas de pensões não familiares. Dessa forma, as  mulheres assumiram  profissões ligadas direta ou indiretamente com as atividades domésticas,  em especial as de  cama e  mesa.
            Outras profissões são novas, como é o caso das casas de banho-velho costume dos romanos  reeditado nas colônias dirigidas por mulheres. Algumas estavam associadas a hotéis, e outras eram independentes. As águas do  arroio Tega, canalizadas, alimentavam grandes banheiras servidas por água corrente. Essas casas constituíam um dos prazeres dos rapazes, que as  freqüentavam nas tardes de sábado. Após o expediente, os homens se encontravam em casas de banho. A mais  afamada  delas  era de propriedade de  Castorina Alves, uma mulata forte  e disposta. Segundo alguns  informantes,  as casas de banho teriam um caráter semelhante às casas de massagem atuais.  Apesar de serem mantidas por mulheres, estas não as freqüentavam.
            Merece menção especial, no setor de serviços, a profissão de mulheres donas de pensões não familiares. Em Caxias, em 1932, as donas de pensões não familiares e de salas de bailes, representavam nada menos do que  26% do total das mulheres registradas. Entre elas foram registrados os nomes de: Angelina Crestani (Angelona), Ignácia de Brito, Amélia Huber, Jovina Lopes, Basílica Anzolin, Stela Bertelli, Antonieta Flores da Silva, Elvira Borges, Clélia Dudoth, Alzira Flores, Hermínia Marmoros (Salomé), entre outras não registradas.
Há indícios, em algumas memórias, de que a prostituição era praticada pelas imigrantes sem recursos, nem todas foram viver em pensões. Esse é o caso de Angela Crestani, também registrada como Angelina e apelidada de Angelona, que  foi  a mais famosa dona de bordel da cidade. Registrada  como sendo pensão não familiar, venda de bebidas e salão de baile  entre 1925 e  1951. Entretanto, parece ter começado mais cedo. Sua pensão estava situada na rua Ernesto Alves, zona do meretrício, situada  no centro da cidade. Sua casa abrigava mulheres de várias  partes do Brasil, que permaneciam na cidade algum tempo na casa, sendo após substituídas por novo “estoque”... Angela  morava com a família na  pensão, sendo considerada pelas suas hóspedes como uma  verdadeira mãe.  Sendo boa compradora e cumpridora, pagava em dia seus compromissos, era conceituada no comércio local. Antes de ser proprietária de pensão, na sua juventude havia atuado no setor em  outras pensões. Seus clientes eram homens  proeminentes  da sociedade. O local funcionava como sala de baile e área de convivência com os amigos, para ouvir uma boa orquestra.                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                         
            Muitas prostitutas se  tornaram donas de bordéis, e outras casaram, deixando a antiga profissão. Uma dona dessas pensões relembra “quarenta e cinco gurias  que moravam comigo casaram e as que não casaram estão amigadas. Até com delegado uma casou. [6] Por outro lado muitas das “meninas” da cidade eram encaminhadas para a capital federal, onde faziam sucesso nos melhores “castelos”. Mas,  ao se casarem, sempre  podiam  voltar  para a família.
            Outra profissão que ocupou as mulheres imigrantes foi a de parteira.  Representavam cerca de 48% do total  das mulheres ocupadas no setor de serviços. Poucas  possuíam formação profissional. Eram parteiras práticas que haviam aprendido com outras parteiras, como Genoveva  Meneguzzo Ioppi, que aprendeu o ofício com sua tia. Num período em que o número de médicos era insuficiente para atender a população, as parteiras eram importantes para o atendimento das mulheres. As parteiras não só atendiam aos partos, como também davam consultas para doenças decorrentes do sexo, algumas faziam abortos,   acompanhavam as mães e os filhos recém-nascidos nos cuidados do pós-parto.
            Entre as parteiras registradas encontram-se Emma Nora, Basílica Brant, Maria Centenaro, Zulmira Capelini, Araci Coelho, Maria Courtois, Luiza Demarqui, Orphelia Emer ,Suzana Maier, Maria Segalla, Olga Zimermann e Maria Duso, registradas na  zona urbana. Sylvia  Belló residia  em Galópolis, Regina Adami, Maria Basso e  Cecilia Toniello em Ana Rech. Clélia Sebben, Bambina Paraboni e Catarina Torun em Nova Vicenza. Florentina Pretto uma das parteiras mais conceituadas da cidade  de Caxias, respondeu a  três processos por exercer o “comércio de abortos criminosos”, sendo absolvida em dois deles. Os delitos denunciados estavam ligados a abortos feitos em prostitutas.
Serviços como o de hotel,  de casas de pasto, de botequins e similares  eram    extensões  dos serviços domésticos, para os quais as mulheres tinham sido longamente treinadas, havendo  supremacia da mulher nessas atividades. Quase todos os hotéis, as casas de pasto e os botequins eram  dirigidos por mulheres, ainda que algumas vezes existisse um proprietário nominal.
            Algumas das mulheres imigrantes trabalharam em profissões consideradas masculinas, como a de carreteiro, de tropeiro, de ferreiro, de sapateiro  e de açougueiro. Algumas mulheres desempenharam essas atividades; outras mulheres seguiram o pouco convencional   ofício de tropeira. Trabalho difícil que requeria longas ausências  de casa, ainda assim há mulheres tropeiras como Catarina Cavagnolli e Cezira Oliboni, que tinham tropas e carretas; Ana Rech que tinha uma   casa  de pasto e seu potreiro.


TROPAS E TROPEIROS
 Naquela época os viajantes não tinham pressa. (José Koff)

               A Região Colonial Italiana era  uma área de  fronteira, situada entre a civilização e a natureza selvagem. Por ela passava a antiga estrada Provincial, que ligava os Campos de Cima da Serra a  São Sebastião do Caí. Mais tarde, essa estrada recebeu o nome de Rio Branco,  na porção que ligava Vacaria ao vale do rio Caí. Era esse o caminho dos tropeiros e mais tarde foi esse o caminho dos imigrantes.
            Tropeiro era o homem encarregado do transporte de mercadorias e de seres vivos. O tropeiro carregava crianças  nas  bruacas de suas mulas,  mulheres cansadas, arcas com os  bens dos imigrantes. Os  tropeiros da região realizavam vários tipos de transporte: de mercadorias, de animais e de pessoas. Na região, havia muitos tipos de tropeiros: que eram donos de suas tropas e que serviam a casas de comércio; os que eram contratados pelos fazendeiros para transportar tropas de bovinos, suínos e aves do lugar de criação para o da venda e os contratados pelas  casas comerciais para o transporte de gêneros coloniais  até a capital, e dos produtos industrializados da capital para a região colonial. Vittorio Bucelli avistou uma dessas estranhas tropas e registrou:

Num certo ponto sentimos sons estranhíssimos e no fundo da estrada vimos uma nuvem de pó :involuntariamente paramos todos ao mesmo tempo, enquanto um peão gritava “  não , é   apenas uma manada de porcos” .

De fato mais de 3000 porcos vinham correndo pela estrada o quanto sua gordura permitia, espantados por dois jovens armados de longos bastões...grunhindo em uma gama de sons pouco musicais.  Numa orquestra infernal que combinava o fedor ,com a  banha, santo Deus, que beleza.[7]

            Os tropeiros eram  responsáveis  pela distribuição das mercadorias, pela distribuição dos colonos em seus lotes e pela distribuição das notícias vindas de outros lugares e pela expansão da própria língua. Costa recorda  os tropeiros que passavam pela casa comercial de seu pai, situada no Retiro (Alfredo Chaves).
Então o brasileiro é aquele que falava o brasileiro, que era o português, Mas a gente dizia que falava em brasileiro. E quem falava em brasileiro era negro, porque lá em casa era pouso de negros, que eram os tropeiros que iam para Guaporé e seguiam pelo caminho de Fagundes Varela. Depois eles iam... às vezes eles iam para a serra, às vezes voltavam para pegar o caminho de Lagoa Vermelha e Vacaria, e como meu pai tinha uma casa de comércio,  uma casa grande, e na frente  tinha uma cantina, e, no fundo,  umas grandes estrebarias. Então eles paravam ali, pastavam os animais, acho que eram mulas. E tinha potreiro, um enorme potreiro, que ainda hoje existe. Tem quase uma colônia de potreiro. Então eles largavam os animais ali, e como eram animais mansos,  davam pasto, e depois quando chamavam já recolhiam. Ficavam às vezes até dois dias. Então iam tomar banho de rio, faziam as comidas deles, preparavam comida para andar, ensinavam minha mãe a fazer charque. De noite eles vinham em casa, e quando era época de cana-de-açúcar, então nós plantávamos aquela cana de, eles entendiam e falavam em português, a gente entendia.. Ele não falava o português, só entendia. Pouquíssimas palavras, ele sabia.


            Ou seja para atender os tropeiros aos poucos os colonos aprendiam a língua nacional e a comida nacionais.  Nas regiões fronteiriças mais do que em qual quer outra a bodega e o pouso são fundamentais , visto que  representam um espaço de convívio e de mediação   entre a zona da produção agrícola e a da produção das  mercadorias industrializadas.. A casa de comércio ,o pouso ,o pasto e o  comerciante representavam abrigo certo para os tropeiros e as para suas tropas Como observa Reginatto” existia também um vínculo de amizade muito estreito com o dono da casa comercial ao ponto dele”
 O tropeiro era o encarregado da distribuição  das mercadorias e das notícias. Mas antes demais conduzia a tropa. Uma tropa era composta por cerca de 20 mulas. Mulas são animais híbridos resultantes da cruza de uma égua com um jumento . Os filhotes são parecidos com a mãe, mas tem  a força do pai. O  acasalamento  entre o jumento e a égua é uma atividade de difícil execução, pois  aquele tem menor estatura do que esta e, por vezes, precisa ser ajudado que a conjunção ocorra. Os filhotes resultantes deste cruzamento são estéreis. Possuem   equilíbrio e   força a mula (ou burro) conseguindo andar por caminhos íngremes nas montanhas, sendo utilizados  como animal de carga.  As mulas são mais fortes que o cavalo e o jumento,  podendo  carregar até 100 quilos de carga. .Mas ainda assim  devem descansar após um dia de tropeada.  Para o descanso das mulas era usado o potreiro e para o descanso dos tropeiros a casa de pasto. Sobre  a  casa de pasto conta João Corso
Os carreteiros vinham de São Sebastião do Cai e iam para Vacaria, Lagoa Vermelha e Bom Jesus . Já os Tropeiros eram anunciados de longe pelo barulho do cincerro. A noite se reuniam na casa de pasto para contar histórias ,comer pinhão e tocar gaita a casa de negócio tinha quartos para os que quisessem a 10 réis por noite  e o potreiro custava  20 réis [8]

Muitas vezes a casa de pasto era anexas à casa de negócio. Nela  não havia  apenas produtos mas local de repouso tanto para a tropa como para o tropeiro  “os que traziam gado vinham tocando a tropa a  cavalo e deixavam o gado todo num potreiro que tinha na casa de comércio, que também servia de pouso. ”[9]
.Burton  ao analisar os diversos tipos de rancho observa que
A estalagem ou hospedaria é a quarta e última face da evolução do rancho, não se falando no hotel, que naquele tempo não se diferençava muito da hospedaria. Dava cama e comida para o hóspede e "camaradas"(empregados dos viajantes) e pasto para os animais.

Burton  conclui que muitos destes pousos deram origem a povoações , este observação  parece ter identificar a pousada de   Ana Rech.


MULHERES TROPEIRAS
As notícias não vão ,chegam sempre
Como quem traz   uma carta pessoalmente
.Oscar Bertoldo

A atividade de tropeiro era eminentemente masculina o que não impediu que algumas mulheres ao enviuvarem  adotassem essa atividade. Não foram só as imigrantes italianas que conduziram as tropas .Nilza Huyer Ely  no constata a existência de mulheres tropeiras  no vale do rio Três Forquilhas. Observa que as mulheres estavam acostumadas a  trabalhar ao lado dos maridos, cuja atividade principal era a  de tropeiro , “na falta do chefe de família, a mulher, incontinente ,tornava-se tropeira ,sem qualquer dificuldade e sem solução de continuidade nas atividades e negócios” [10] . Entre as tropeiras estão  :Dona Cucha,Paula,Witt,Luiza Kilpell,Benta Hoffmann e Isabel Pinheiro,  ao que tudo indica bem mais numerosas do que as da região da  colônia>há assim nos casos analisados uma relação entre a viuvez e a adoção do tropeirismo.. Entre as mulheres donas de tropas registradas estão  Cecilia Oliboni , Catarina Cavagnolli e Ana Rech.
Cesira Soso natural de Verona chegou ao Brasil em 1878  acompanhando seus pais. Pouco tempo depois casou com Giuseppe Oliboni, fixando-se no lote nº 9 do travessão Rondelli. O  marido morre poucos anos depois . Cesira como  Viúva Oliboni consta  nos livros de Registro de Industrias e Profissões como  dona de uma tropa de mulas, de uma carreta e de uma serraria  à água. Pouco    tempo depois  se casa de novo apesar de ter casado de novo, para garantir as isenções mantêm o antigo  nome de viúva Oliboni .Manteve os mesmos negócios entre 1905 e 1924. Cesira mandava na família chegando ao ponto de escrever um  requerimento à Intendência em nome de seu filho Anacleto ,que era  maior de idade informando que tendo ela vendido  a carreta , ele não pode mais viajar.
Catarina Cavagnolli chegou em Caxias em 25 de maio de 1877,vivendo na Xª Légua , no travessão Rondelli . Em 1905  tem registrado em seu nome três   lotes, no mesmo Travessão, os de número 45, 50 e 51. Em 18989, quando já tinha mais de 55 anos, informa à Intendência que vai trabalhar com uma tropa de seis mulas, para “ transportar mercadorias dos comerciantes para fora e para dentro da X Légua” [11]. Solicita ser lançada como proprietária de tropas e não como comerciante. Catarina distingue sua profissão da do comerciante ,pois se afirma ser apenas  ” intermediária entre as casas comercias “.O trabalho com tropas parece ter sido Catarina manteve a mais  exclusiva das profissões masculinas  junto com outras  atividades econômicas  até o fim de sua vida. Sobre a vida pessoal de Catarina apenas encontrou-se rumores,  segundo o qual não seria casada ,tendo um filho fora do casamento. Nada foi  comprovado.
Ana Rech chegou á colônia Caxias em  abril de 1877, sendo uma das primeiras moradoras  do travessão Leopoldina., comprou o  lote nº 104   na 8ª Légua. Ana Maria Pauletti era viúva e  tinha 49 anos ,nasceu  em Pren em 1º de outubro de 1828 . Aos 19 anos  casou-se  com Osvaldo Rech , de 25 anos, natural de Muner como ela  filho de agricultores sem terra ,em 20 de novembro de  1847, passando a viver como meeiro em Pedavena ,onde nasceram  seus  nove  filhos A vida familiar foi marcada pela tragédia. Sua filha mais velha morreu quatro meses após ter casado e  a seguir  morre Osvaldo  marido , na véspera do natal de 1875. Foi então que Ana decidiu emigrar.
 A região onde ela se estabeleceu  situa-se  a meio   caminho entre a região dos campos  e a da colônia  Caxias Na nova terra aproveitou a circunstância do lote situado no caminho das tropas e construiu um potreiro, e uma casa de pasto, aproveitando a sótimas aguadas Durante algum tempo possuiu uma tropa provavelmente dirigida por um de seus filhos, segundo Livro de lançamento do registro de industrias e profissões, em 1900  mas dela logo se  desfaz. As águas e a casa comercial se  tornaram  famosos  O pouso de Ana Rech  parece se enquadrar na  classificação Burton. Tão conhecido  era seu potreiro ,que em 1915 nos registros da Intendência a localidade antes chamada de Leopoldina passa a se chamar de Ana Rech nos registros oficiais.
    Dall’Alba  resume assim a saga de  Ana Rech


começou a trocar o pouso e seu trabalho com os produtos transportados pelos tropeiros, que objetivavam o centro maior, o Campo dos Bugres.Tornou-se entreposto de mercadorias, muito popular
e querida entre os moradores e tropeiros. Atuando também como parteira teve muitos afilhados na comunidade. Ao doar terras para a Igreja, colégio, provocou a formação de uma comunidade que trás
com orgulho o nome de sua fundadora. Morreu em 1916 aos 88 anos estando seus restos mortais abrigados na Igreja matriz desde 1977, quando foi criado um monumento em sua homenagem. Ana Rech é a única localidade que tem o nome de uma mulher imigrante e o conserva.
[12][13]




Se na condução das  tropas havia poucas mulheres nas casas de pouso e nas casas de negócio  o seu  papel  era vital. Pois dela dependiam não  feitura das refeições como de toda organização da casa comercial . Atrás da loja ficava “uma sala e uma cozinha enorme com fogão de hotel mesmo, fogões os maiores que tinha, então aquelas panelas enormes e toda família comia junto na mesa, primeiro os mais velhos depois as crianças, era um verdadeiro hotel[14]”, nela comiam também  viajantes, trabalhadores,   amigos e compadres.
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VELHOS HÁBITOS NOS NOVOS TEMPOS


O trabalho é o novo nome da cidade

Oscar Bertholdo

O grau de instrução das  mulheres analisadas na pesquisa no  período de   1884 a 1924  varia de acordo sua procedência. 100%   das mulheres originárias dos Estados Alemães sabiam ler   e  89%  das   procedentes do Tirol  sabiam ler. As que vieram da Itália   28% eram alfabetizadas. Não é por acaso que foram estas a que mais sofreram das conseqüências da ignorância. A análise dos mapas escolares do período inicial da colonização, ou seja, de 1881 a 1900, revela que ¾ dos alunos eram do sexo masculino, apenas 1/3 eram do feminino.
 Após 1910, na região urbana há uma mudança dos percentuais ,havendo maior número de meninas matriculadas nas diversas classes. Na região rural no período analisado a diferença se mantém .A um dado singular o número de analfabetas aumentou na segunda geração. Se em 1886, 33% do total  das mulheres independente da origem  sabia ler, em 1921 o número de alfabetizadas baixou para 21%.
Os meninos eram enviados à escola para ter as condições mínimas necessárias para dirigir a propriedade, já as meninas não tinham esta necessidade, pois se “as mulheres não soubessem muito, não tinha importância, desde que soubesse o marido.”[15]Mas o pai não me deixou ir à aula, embora eu gostasse. Se me tivessem mandado, eu aprendia e bem, mas não me deixaram. Achavam que às mulheres não era necessário.”[16]
Muitas das mulheres tinham consciência da diferença de tratamento a que eram submetidas pela família em relação a educação ao lhe ser negada a freqüência mínima em uma escola a menina ficava condenada à ignorância. Da ignorância para a submissão a distância não era grande. Ao saber ler e fazer contas o homem afirmava sua superioridade sobre a esposa ignorante, ignorância que era transmitida às  filhas .
Não sabendo ler, ou lendo pouco, a mulher assinava sem saber “os acordos desiguais” que possibilitavam  a transmissão das terras familiares para os irmãos homens .Não sabendo fazer contas não controlava os ganhos da propriedade, nem entendia as  explicações que o marido para cortes nos gastos.
A ignorância afastava as mulheres da direção dos negócios e encaminhava-as à total submissão às decisões do marido na aplicação da receita da produção. A ignorância em que a mulher imigrante, e mais precisamente da  filha de imigrantes, foi mantida  pelo grupo social. A falta de conhecimentos serviu para reforçar sua pretensa inferioridade em relação ao homem. A desigualdade era tão “natural” que servia como motivo de orgulho pessoal à distribuição injusta dos bens “Aos filhos se dá um pedaço de terra, às filhas se dá o dote”, uma repartição definida pelo sexo.  Na repartição desigual há um agravante: a filha pagava pelo enxoval e pelo dote, enquanto os filhos recebiam as terras como paga pelo trabalho não remunerado realizado. Mas as filhas também trabalhavam sem remuneração, este era um detalhe que tinha  importância, nem para próprias filhas.
A partilha  dos bens era uma  decisão paterna. As filhas eram deserdadas pelo sexo. Este costume passou a ser adotado no momento em que a Diretoria de Terras deixou de decidir sobre as terras. Na documentação da intendência não  se encontram requerimentos exigindo mudanças nos termos das partilhas. A divisão injusta não  provocou reclamações   das possíveis  lesadas. Praticamente a única maneira de uma mulher tornar-se proprietária era ao casar  ou na melhor das hipóteses enviuvar.
Como imperativo categórico    herdavam pela morte  dos pais as filhas que não tivessem irmãos .Nem a condição de filha única salvou Maria Tonietto da injustiça. Residiu no lote n.º 2 da Linha Feijó, Colônia Sertorina., no período que vai de 1900 a 1918   durante este tempo encaminhou vários requerimentos à Intendência, pedindo isenção de impostos. Segundo afirmava seu  pai idoso morava com ela, sendo por ela sustentado já que ela   costurava para fora. Apesar  pedidos não foi isenta dos impostos de conservação de estradas. Maria Tonietto  não aparece como proprietária nos registros. O pai idoso, sustentado pela filha que  pagava os impostos   a terra devidos não transferiu para a  propriedade em troca do sustento garantido como teria feito com um filho homem.
      Mas as mudanças  se avizinhavam no Livro de Lançamento de Industrias Profissões de  só no ano de 1932 havia de  46 mulheres registradas. Destas  6 eram  modistas, 12 donas de bordéis  e eram  22  parteiras, representando   cerca de 87 % do total de mulheres ocupadas em ofícios e profissões. Repercutiu na imprensa local o caso de Segismunda Pezzi, que começou  a trabalhar no banco Francês e Italiano em   1927,e que se tornou a primeira mulher a ocupar o cargo de presidente do sindicato dos bancários no Brasil .Sobre o assunto escreve um articulista no O Assombro

em toda a parte principiaram a botar a cabecinha de fora. Primeiro foram costureiras apenas .Depois manicures agarrando-se a vida com as unhas ...dos outros. Em seguida empregadas de balcão e datilógrafas mais tarde deram uma topada nos garçons e viraram garçonetes.(....) O fato do avanço é tão grande que se isso continuar termos uma prefeita, uma bispa e uma delegada de polícia[17]


. Mas ,ainda assim a injustiça perdurava .Em 1940 foi movida uma ação pedindo a anulação da partilha, a autora argumenta, por intermédio do seu procurador, que fora ludibriada, por ser  analfabeta e humilde,  tendo sido levada a  assinar  – sem saber –  uma procuração em que desistia da sua parte da herança, deixada  pelo falecimento da sua filha. O juiz defere o pedido da autora. O réu recorreu, em novo julgamento o desembargador indefere este pedido de apelação corrigindo  o valor da causa.
Em  1943 foi  realizado  o inventário   de um homem  que morreu, sem deixar testamento. Como sua esposa já era falecida filho mais velho foi o inventariante.  Através do seu procurador, vem a juízo requerer que os bens descritos sejam certificados junto a administração pública, para após serem partilhados. As filhas renunciam a sua quota hereditária em favor dos irmãos
Mas a injustiça cansa e a mulher que durante muitos anos carregou a propriedade rural  revoltou-se e  abandonou a zona rural. Hoje para encontrar uma esposa o jovem colono deve procura-la na cidade . Mas a mulher criada na zona urbana  não se adapta ao trabalho da propriedade agrícola .E os casamentos deste tipo dificilmente ocorrem.
   A guerra dos sexos regional não se travou por questões de amor mas em questões de bens .Além de serem lesadas pelas partilhas desiguais de bens  mulheres precisam lutar contra a injustiça que resultam de seus relacionamentos amorosos ou maritais.
. As mulheres algumas vezes de forma voluntária ou não se submetem à tradição. Em alguns  casos as mulheres são   enganadas, tanto pelos pais quantos pelos irmãos sendo excluídas dos bens  Na maioria dos casos analisados as  herdeiros aceitaram  acordos extrajudiciais, que de certa forma mantêm o costume de excluir as   mulheres dos bens herdados.
A educação realizou seu milagre. A permanência jovens na escola e a   conclusão do curso fundamental ,garantiu sua ida ao ensino médio  realizado na zona urbana. A maior parte das jovens vai para a universidade e não  mais retornam à  vida  da colônia. Ao contrario delas alguns rapazes não concluem o ensino fundamental e permanecem com os pais levando adiante o trabalho agrícola  e o da produção de vinho.
Hoje a família que vive na zona rural é diferente da de antigamente, sendo  em média composta por quatro   filhos por família, destes em geral  apenas um permanece com os pais, sendo ele herdeiro presuntivo da terra.  As moças  que ficam na colônia em geral  não concluíram o ensino fundamental.  Algumas  tem  filhos antes do casamento ,por vezes  encontram uma segunda  união  estável ,sem a legalização do casamento, quando isto ocorre o companheiro passa a  auxiliar os pais da mulher,  fornecendo assim mão de obra  barata para os trabalhos agrícolas. O custo da mão-de-obra agrícola é de 45 reais por dia, sendo cara, motivo pelo qual este tipo de relação é   aceita
 Nas propriedades analisadas fica evidente que as  jovens da zona rural buscam em maior número um curso superior que os jovens. São elas que adquirem os computadores e se preparam para uma nova  vida.. Hoje o trabalho na colônia deve ser pago e a escravidão familiar está extinta. Os tempos em que o sexo determinava a submissão  e a exclusão da mulher , definitivamente acabaram,  como está acabando  a produção familiar e a pequena propriedade, premida pelo preço de mão-de-obra e pela falta de mulheres a serem exploradas



BIBLIOGRAFIA
.BUCCELLI, Vittorio. Un viaggio a Rio Grande del Sud. Milano: Officine Cromo-Tipografiche L.F. Pallestrini & Cia, 1906.
Conheça-me por dentro. Correspondência da Comissão de Terras  copiadas por João Spadari Adami
CORSO,  Mauren Corso .História da família Corso .Não publicada.
COSTA, Rovilio e BATTISTEL, Arlindo.  Assim Vivem os Italianos. Vida, história, cantos, comidas e estórias.  Porto Alegre, EDUCS/EST, v. 1, 1982
COSTA, Rovílio. Antropologia visual  da imigração italiana .Porto Alegre: Est, 1978
DALL ALBA, João L.Pe. e outros. História do Povo de Ana Rech .Volume 1-paróquia .Caxias do Sul:Educs,1987 .
Depoimento de  Angelina De Lazzer Perini- Cedoc Universidade de Caxias do Sul
Depoimento de Raymundo  Pezzi IN: GIRON, Loraine Slomp e BERGAMASCHI, Heloísa. Casas de Negócio .Formação econômica Regional. Caxias do Sul.Educs,2001
ELY , Nilza Huyer. Vale do  Três Forquilhas .Veredas, vidas e costumes. Porto Alegre :Est,1999p.55
Jornal O Assombro ,Caxias  Ano 2º nº 6 ,1937
Jornal O Momento ,Caxias  ano de 1940

DOCUMENTOS CONSULTADOS
Livros de Registro de Lançamentos de Industrias e Profissões.1890 a 1943 AHMMCS
Mapas Estatísticos
lançamentos de Imposto Focolar
Requerimentos de1890 a 1940  AHMMCS.
Ofício de 28 de novembro de 1904
Processos civis de  1927-1940.Centro de Memória do Judiciário .Ucs

Requerimentos existentes no Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami deCaxias do Sul:
 Requerimento datado de 06 de junho 1903
Requerimento datado de 7 de fevereiro de 1905
Requerimento de 02 de junho 1905
Requerimento de 1 de maio de 1904.
Requerimento de 10 de maio de 1898.
Requerimento de 15 de maio de 1903.
Requerimento de 16 de agosto de 1964.
Requerimento de 16 de janeiro de 1910.
Requerimento de 2 de junho de 1905
Requerimento de 26 de maio de 1900
Requerimento de 27 de janeiro de 1898 e de 31 de maio de 1898.
Requerimento de 31 de dezembro de 1898.
Requerimento de 4 de setembro de 1898.
Requerimento de 6 de abril de 1898.
Requerimento de 7 de fevereiro de 1905.
Recenseamento de terras – 1890 Livro 29 AHMJSACX
Requerimento  de 3 de novembro de 1898.
.Requerimento de 9de dezembro de 1911
Requerimentos de 1913.




     

http://site.cruzeironet.com.br/sorocaba/fasciculos350anos/fasci06/pg03.shtml


*
[1]             COSTA, Rovílio. Antropologia visual  da imigração italiana .Porto Alegre: EST, 1978.  p.148.
[2]             Requerimentos de 1913.
[3]             Registro do Inspetor no livro de lançamentos do Imposto Focolar, reconhecendo a “ extrema miserabilidade das viúvas”.

[4]             Giovana Perin encaminha vários requerimentos à Intendência Municipal de Caxias, nos anos de 1900, 1905, 1906.
[5]             Encaminhou vários  requerimentos de 1900 a 1918.
[6]             Depoimento de Abetina Gomes de Oliveira, prestado  em  setembro de 2005  a Liana Pulita Martini e Lucimara Goreti de Oliveira.
[7]             BUCCELLI, Vittorio. Un viaggio a Rio Grande del Sud. Milano: Officine Cromo-Tipografiche L.F. Pallestrini & Cia. 1906. p. 222.

[8]             Entrevista concedida  a Mauren Corso citada  na obra História da família Corso .não publicada.
[9]             Depoimento de  Angelina De Lazzer Perini-Cedoc Universidade de Caxias do Sul
[10]            ELY , Nilza Huyer. Vale do  Três Forquilhas .Veredas,vidas e costumes.Porto Alegre :Est,1999p.55
[11]            Ficha completa ano de 1905, requerimentos de 19/04/1898 e de 27/10/1906.

[12]           
[13]            DALL ALBA, João L.Pe. e outros. História do Povo de Ana Rech .Volume 1-paróquia .Caxias do Sul:Educs,1987 p. 49

[14]            Depoimento de Raymundo  Pezzi IN: GIRON, Loraine Slomp e BERGAMASCHI Heloisa.Casas de Negócio .Formação econômica Regional. Caxias do Sul.Educs,2001.p432.
[15]            COSTA,  Rovílio. Assim vivem ...Vol. I, p. 398.
[16]            Idem p. 251.
[17]            O Assombro Caxias  Ano 2º nº 6 1937