quinta-feira, 8 de setembro de 2011

CAPELAS:LUGARES DE FÉ ?


Igreja de Menino Deus.Imagem da internet .
Uma das muitas subdvisões das sociedades

Tomás Eloy Martinez escreveu um livro sem similar: Evita. A escrita da  história para ele é uma ficção: “ Todo relato é, por definição infiel. A realidade (..) não pode ser contada nem repetida. A única coisa que se pode fazer com a realidade é inventá-la  de novo.”
Nada mais verdadeiro.Ele entendeu como Walter Benjamin  o significado  da escritura da história. Ou seja , a busca de pistas através dos escombros  do passado.
Padre Antônio Gallioto foi iluminado, a seu modo. Pois percebeu a peculiaridade das capelas e seu significado único. Poucos se deram conta do que   elas representaram  para os desvalidos imigrantes,perdidos nas matas das  encostas do Planalto do RS.Mais do que um espaço religioso,um porto n de encontro social  na solidão conquistada com a  nova terra.
Por que começar o texto com personagens  tão distintas ? Simples. O primeiro  apresenta  as dificuldades da  reconstrução histórica e o segundo as pistas para o entendimento do problema. Sem saber, ambos concordavam com  Benjamin  nas  Teses sobre a filosofia da história. Antes de todos, Benjamin  pensou na história dos oprimidos,dos  que não tem voz, dos que não tem documentos.Ficam dessa forma condenados ao esquecimento.Muitos são os esquecidos :escravos, colonos e mulheres calados ao longo dos séculos. A voz dos colonos é ouvida através da  voz da capela.
Melhor voltar ao tema, ou seja as capelas.
As capelas eram e são em primeiro lugar um pequeno templo para a reunião dos associados ..Ao deixarem as  igrejas(algumas magníficas )  de seus padroeiros ,situadas nos lugares onde nasceram na Itália,  os imigrantes precisavam retomar sua vida social. Em seus paesi era a igreja o lugar de encontro,de realização dos ritos de passagem, representados pelos sacramentos(batismo, confirmação eucaristia e casamento e óbito) Na colônia as paróquias eram distantes sendo impossível visitá-las com a frequência exigida pela Igreja.A solução  foi a Capela.
 Em segundo lugar a capela era propriedade de uma associação :a dos moradores de uma pequena  comunidade. Muito antes das associações de bairros os camponeses europeus sabiam como ninguém da força de uma comunidade.. Ter a capela em sua terra fazia(  e faz ) do colono uma espécie de  sócio de Deus, que como tal poderia não só  hospedar o padre como  gerir  a  sua receita .Para isso eram escolhidos os fabriqueiros, que por um ano eram os representantes da comunidade. A renda das festas do padroeiro  servia para a manutenção da construção e melhorias e que com o p assar do tempo de tornam cada vez maiores.Com o tempo maiores se tornaram as festas e,portanto, as rendas. , reunindo mais de  mil pessoas por evento, onde são servidos almoços típicos da colônia.
 Os associados podiam ( e podem )  ainda  manter ou vender os terrenos do cemitério que pertencem aos associados  .O fabriqueiro da capela é o grande beneficiário do sistema.Pode  alugar o campo de futebol , a cancha de bocha e administrar a copa do salão comunitário, onde os homens se reúnem ,nos finais de semana ,para jogar cartas e beber .O dono da bodega da capela era  o dono da  sua receita Assim o poder econômico se faz presente na capela,que o representa.
Mais importante que o fabriqueiro era o dono do lote onde ela  foi construída. Esse de certa forma era o dono . A associação em geral , tinha um  estatuto ,mas os terrenos nunca foram a ela  doados. Assim havia uma ambigüidade pois ela pertencia ( enquanto construção ) ao grupo ,mas,  a terra era propriedade individual. Tal situação gerou conflitos, quando da morte daquele que cedeu ( ou emprestou?)o terreno. Os herdeiros exigiam seus direitos e o lote da capela era um deles.
Muitos foram os conflitos e as disputas entre seus associados Quando alguém se sentia lesado abria sua própria capela. Ser dono de uma capela era  quase, tão importante como ser dono da terra. A cada briga entre famílias uma nova  capela era construída. Como a capela era  poder a organização de uma nova sociedade (esse  era o nome da associação)  e a construção de uma nova capela representava a ascensão social de uma nova família ou de um novo grupo. Menos do que cristã a disputa pelo poder na capela lembarva a ação dae uma  máfia (ou cosa nostra )  avant la lettre.
Capela era um lugar de encontro social e de descanso dos mortos
    Em nenhum outro lugar há mais capelas do que na Segunda Légua da antiga colônia Caxias. Uma das  capelas  é a de São Vigilio, situada no extremo sul do Travessão Trentino .foi construída em alvenaria , possui   vitrais e uma torre , de 4 pavimentos ,adornada com esculturas de anjos, sendo  a mais bela de toda região .Em torno do padroeiro  São Vigilio, bispo de  Trento, se reuniram as famílias Bampi, Berna,Bertottii,Boniatti,Cappelletti,Decoz,Fiamoncini,Fruet,Longo,Lazzaretti,Mezzomo,Marcchesini,Onzi ,Perottoni Polesso, Paniz, Perini e Vitti.
 Dela se originaram-se outras três : a de São João, a de São Martinho e a de Menino Deus . Em 1885 , foi inaugurada a  capela de Menino Deus .reunindo as famílias  Bampi, Boniatti, Cembrani, De Gasperi, Montemezzo, Tonietto

        Em 1885 foi organizada a capela dos Santos Anjos, inicialmente feita em madeira ,estava situada no lote de Vitório Crevellin ,mais tarde foi construída outra, também em  madeira ,na terra de Olivo Cappelletti sendo então erguido a seu lado um campanário de pedra  Foi reconstruída em alvenaria em 1949 ,em  terreno alto e plano ,doado por J.  Perini , possui     belos vitrais ., cercada por jardim ,campo de futebol e pelo salão paroquial.. Seus associados fundadores pertenciam as famílias Cervelin, Broilo, Milesi, Cappelletti, Colombo, Perini De Gasperi, Bridi ,os Slomp e  os Radaelli Situada em local alto domina um dos mais belos vales da região. Brigas entre associados determinou o surgimento de  outras três  capelas ,  a  de São Roque ,  a  da Salete e a de Santo Antônio da Forqueta.


Lembrança da construção da  nova
 capela de Santo Antônio de Forqueta
(1945) que se torna paróquia em 1954 .

Em 13 de junho de 1913  foi inaugurada outra  capela. A de  Santo Antônio de Pádua., situada em Forqueta. Os sócios eram apenas sete:  Joaquim Slomp , José Generosi , José Dalla Justina , Luiz Savegnago , Augustin  Guerra, Mário Novelli e José Silvestre.,provenientes das divisão da de Santos Anjos.
Nova divisão ocorre em 1945 e a  caapela Nossa Senhora da Salete foi construída. Seu fundadores foram  Sestilho Cappelletti, Euzébio Pergher,  Hermenegildo Pergher, José Slomp Filho, João Pedro Perini   e Genoici Valentini.(hoje ao município de Farroupilha.)
A cada subdivisão das capelas o número de  associados se torna  menor.Em lugar das vinte f ,que se reuniam para a organização da capela, o número   baixou para sete  famílias. Algumas das capelas são tão próximas umas das outras, como é o caso da de Santos Anjos e a da Salete,Menino Deus ,São Martinho e São João , que de uma situada no alto pode se avistar as outras.Não  mais que um quilômetro e meio as separam-nas.A medida que as capelas crescem são derrubadas as antigas e construídas novas. Há casos em que as antigas ficam ao lado das novas, como aconteceu em São José da Primeira Légua.
E onde fica a fé?  Muitos tem fé., é claro  Mas muitas vezes a fé foi (e é)  sobrepujada  pelo poder.
  
Capela esquecida. Caxias do Sul
 foto de Felipe Slomp Giron


Um comentário:

  1. Oi Loraine:
    Achei bem interesante essa postagem sobre as capelas.
    Obrigado.
    Sergio (Slomp) Basanesi

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