DO
ADEUS
No vúi saverghene le lege nôve!
Me basta quele antighee!mi só tuto[1]
O luto marca a viagem dos
que deixam sua pátria. Para trás deixaram a terra em que nasceram aonde viveram
seus antepassados.Deixam parentes ,amigos e
toda uma vida já vivida e renegada pelas circunstâncias. "A terra que possuía dava-lha sustento para
três meses ao ano, para sobreviver os italianos pobres deviam procurar
trabalho além dos Alpes ou além Oceano.” (
DALL ACQUA ,1983.P.114) Acostumados à busca incessante
pela sobrevivência, trocar a Europa, onde não tinham futuro, pela América -
terra da esperança - não parecia tão difícil.
Os documentos exigidos para
a viagem eram apenas um entre os demais. Acostumados a viagens periódicas para
outros países alguns dos imigrantes já conheciam a burocracia ligada aos
passaportes.Na grande travessia aqueles que tinham experiência em sair da
pátria auxiliavam os outros que não ainda não
tinham deixado sua terra..
A viagem para eles foi a cerimônia do adeus O
medo do desconhecido embarca com os imigrantes Com eles trazem o passaporte. Atestado
de sua condição de exilados. O exílio
ainda que voluntário não é fácil. Passaporte, exílio e luto-pela perda da
antiga vida e dos antigos laços-marcam os imigrantes até o fim de seus dias.
Os passaportes esquecidos nos
arquivos podem ser prova de incúria administrativa ou de um esforço para esquecer.
Como os navios queimados de Cortês, os passaportes esquecidos marcam a impossibilidade da volta .
Na bagagem trouxeram alguns
livros de rezas e de orações.. Alguns manuais religiosos e guias práticos (Bertarelli1890)Eram as mulheres e os
padres os responsáveis pela cultura e pela vinda de livros. eles trouxeram.
DO ESQUECIMENTO
Nol piánze sol parquel che'l gá assá drio
,pianze perchê el gavêa lu el futuro[2]
O esquecimento para os
imigrantes foi uma conquista. A conquista de um novo espaço, de uma nova
condição social. Da condição de servos,empregados ,meeiros passam para a
condição de proprietários.Em relação ao
valor pela escassez da terra na Europa passam a ser grandes
proprietários .Muitos desejam esquecer a fome e a miséria e os seres queridos
deixados no além oceano.O esquecimento passa pela queima dos antigos
documentos, como uma faxina da memória.
Na terra natal havia o poder
da nobreza e do Estado, os quais temiam por entendê-los, na nova terra
continuam temendo ainda mais por não os entender. Os documentos dos imigrantes
,esquecidos em órgãos públicos- e que hoje jazem aos milhares em arquivos públicos- testemunham a sua
rejeição pelos colonos
Poucos falam da antiga
terra. Esquecer significa calar. O amor da pátria natal é transferido para a
terra, não a nova pátria, mas ao lote do qual são proprietários.
Sem vínculos com os papéis
que lembram sua antiga condição os colonos queimam o que podem do passado. Tal
queima inviabilizou a dupla cidadania de muitos "oriundi".
Por desconhecimento ou por
querer esquecer os registros do passado, alguns colonos deixam de registrar
seus filhos, e até de registrar as mortes. Alguns deixam para
registrar os filhos quando três
ou quatro já haviam nascido. Alguns registram as filhas com nomes masculinos,
outros repetem os nomes para filhos diferentes. Ao que tudo indica há relação
entre o processo de esquecimento o não registro dos filhos e dos óbitos.
DO LEMBRAR
E quá son paron mi! misó tuto![3]
Lembrada é a escritura da
terra. Lembrada é a nova condição de proprietários. Os documentos da terra são
sempre guardados, em pastas, em baús, em caixas e, significativamente, em malas.
Alguns exorcizam o passado
como com cartas jactanciosas procuram trazer o que sobrou da a família para a
nova terra. como no caso de Paolo Rossato que mandou buscar a família inteira [4]·.
Outros escrevem suas memórias. Muitas
das memórias escritas também foram destruídas pelos filhos. Outras foram
preservadas como as de Dal Acqua .[5]
Alguns escondem a verdade da
situação para não preocupar os pais, poucos lastimam a mudança para o Brasil,
sinal evidente que a condição de senhores
parecia compensar as outras perdas.
DA PRESERVAÇÃO
L'ómo,vanti de tut ,ghe ocor che impare
A far qualcosa, ancora tosetin!
Pi tardi,se 'l ga testa bona-scola![6]
Não é por acaso que foram os
padres católicos a pensar na preservação dos documentos e no registro da
história da imigração. Várias congregações religiosas acompanharam o movimento da
população pobre da Itália em direção ao Brasil. Capuchinhos, Scalabrinianos acompanharam
a dura instalação dos colonos nas colônias brasileiras. Deixaram muitos
registros. registrado. Foram os capuchinhos os responsáveis pelo registro da
história dos colonos, entre eles o mais produtivo Frei Rovílio Costa.(cuja obra
vem citada em anexo)
Se os primeiros imigrantes
tinham alguma instrução, a maioria da geração seguinte teve pouco ou nenhum
acesso ao estudo. Desenvolveu-se entre os colonos certo desprezo pelo estudo e
pelo conhecimento. O conhecimento prático era mais importante que o dos livros.
Saber trabalhar valia mais do que estudar.
Foi a partir do centenário
da imigração que a preservação das fontes e documentos começou a ser pensada.
Na gênese do interesse foi importante a criação do curso de História ,em 1960,
e a da Universidade de Caxias do Sul, em 1967.
Antes de 1975 apenas poucos
historiadores se interessavam pela imigração italiana, merecendo destaque a
obra de João Spadari Adami. [7]Em
1975 realiza-se um concurso de obras sobre a italiana no Rio Grande do Sul, os
primeiros estudos são elaborados e publicados··.
No mesmo ano de 1975 foi
organizado o Museu Municipal e o Arquivo Histórico de Caxias do Sul . Na década
de oitenta foram criados os arquivos históricos de Bento Gonçalves, Garibaldi
,Antônio Prado e na década de noventa o de Veranópolis.
Nos arquivos municipais se
encontra muita da documentação sobre a história regional e a maioria da
documentação da história municipal.[8]
A partir da década de
oitenta muitas teses e dissertações de professores da Universidade de Caxias do
Sul, se ocuparam da imigração italiana no RS.[9]
DA BUSCA
Massa vinde instrussion el zê un perícolo!
E bever sol com sê ,com vocassiôn![10]
Na
década de quarenta, o sucesso econômico de alguns imigrantes passa a chamar a
atenção dos historiadores, um dos primeiros que teve sua história registrada
foi o industrial Abramo Eberle , fundador da Metalúrgica Eberle. (FRANCO,1942.)
A partir de década de
oitenta muitos trabalhos de pesquisa são realizados sobre as história dos
municípios surgidos na zona de colonização italiana, histórias de comunidades e
histórias de famílias[11].
As histórias de família que tentam juntar os pedaços perdidos da árvores do
passado. Tem duplo objetivo : a dupla cidadania e a busca das raízes . Há
também um componente de ufanismo, em tal busca, como se no caminho dos sem terra italianos estivessem enterrado
seus brasões.
Tais obras são repositórios
históricos: de fontes ,de mitos e da ideologia regionais. Mereceriam alguns
estudos.
DO DEVIR
Quá el dover lé laorar!
na tassa sôra chi no laora mia?[12]
A
cultura dos imigrantes italianos tem sido estudada pelo Projeto Elementos
Cultural da Antiga Região Colonial Italiana do RS (ECIRS) que recolheu os
indícios da cultura dos italianos e de seus descendentes, sob o ponto de vista
antropológico, e que possui vasto acervo da pesquisa realizada.
Merecem destaque os
trabalhos de dialetologia realizados por Vitalina Maria Frosi tendo como foco a
antiga região colonial, cujo acervo se encontra no Centro de Documentação da
UCS (CDOC).
As publicações do Arquivo
Histórico João Spadari Adami de Caxias do Sul, que tem algumas publicações
tradicionais como os boletins Memória e
Origens. O Arquivo possui vasta coleção de fotos e alguns vídeos sobre o tema
imigração italiana no RS
Há ainda a considerar a
literatura regional sobre a imigração - fonte inestimável sobre a cultura regional,
com várias obras publicadas, entre as quais pontifica a obra O Quatrilho de José Clemente Pozenato.
ALGUMAS REFERÊNCIAS
BATTISTEL, Arlindo
Itacir e COSTA, Rovílio. Assim vivem os
italianos. A vida, italiana em fotografia. Porto Alegre: EST/EDUCS, 1983.
BATTISTEL, Arlindo
Itacir e COSTA, Rovílio. Assim vivem os italianos.Vida, História, cantos,
comidas e estórias. Porto Alegre: EST/EDUCS, 1982.
BATTISTEL, Arlindo
Itacir e COSTA, Rovílio. Assim vivem os italianos.Vida, História, cantos,
comidas e estórias. Porto Alegre: EST/EDUCS, 1982.
BATTISTEL, Arlindo
Itacir e COSTA, Rovílio. Assim vivem os
italianos. A vida, italiana em fotografia. Porto Alegre: EST/EDUCS, 1983.
COSTA, Rovílio Organizador. Raízes de Veranópolis.. Porto Alegre: EST, 1998p. 493
COSTA, Rovílio. Imigração
Italiana, minha paixão de cada dia. IN: 120 de Imigração Italiana. Caxias
do Sul: CHRONOS, v.29, n.1. jan/jul/1996.p.107.
COSTA, Rovílio. Antropologia
visual da imigração italiana. Porto Alegre:
EST/EDUCS, 1976. p. 11
COSTA, Rovílio. Antropologia
visual da imigração italiana. Porto Alegre:
EST/EDUCS, 1976.p. 196.
COSTA, Rovílio. Imigração Italiana no Rio Grande do Sul: vida
costumes e tradições-Porto Alegre: EST Sulina, 1975.
COSTA, Rovílio. Valores da Imigração italiana: cem anos
depois. In: Imigração Italiana: Estudos.
INSTITUTO SUPERIOR DE ESTUDOS ITALO BRASILEIROS. Caxias do Sul: UCS/EST, 1977. p.207
DE BONI, Luís Alberto. A Bibliografia sobre imigração italiana no ano de seu Centenário. In: Imigração Italiana: Estudos. INSTITUTO
SUPERIOR DE ESTUDOS ITALO BRASILEIROS.
Caxias do Sul: UCS/EST, 1977.p.143.
DE BONI, Luís Alberto e COSTA,
Rovílio. Os italianos do Rio Grande do
Sul. Porto Alegre: EST/EDUCS, 1979.
DE BONI, Luís Alberto. A Bibliografia sobre imigração italiana no ano de seu Centenário. In: Imigração Italiana: Estudos. INSTITUTO
SUPERIOR DE ESTUDOS ITALO BRASILEIROS.
Caxias do Sul: UCS/EST, 1977.p.143.
DE BONI, Luís Alberto.
e COSTA, Rovílio .Os
capuchinhos do Rio Grande do Sul publicado pela EST
EDIÇÕES/CORREIO RIOGRANDENSE,1996.
GARDELIN, Mário e COSTA, Rovílio. Colônia
Caxias:origens.Porto Alegre:EST ,1993
[1] A
lei nova não quer conhecer!E bastam-me as antigas! Eu sei tudo! In: BALEN ,Ítalo.Os pesos e as medidas.Porto
Alegre/Caxias do Sul :EST/EDUCS,1981
[2] Não chora só por tudo o que passou,chora
pelo futuro que ele tinha. In: BALEN ,Italo.Os pesos e as medidas.Porto Alegre/Caxias do Sul :EST/EDUCS,1981
[3] Eu sou o patrão aqui! Eu mando! Eu! In:
BALEN ,Ítalo.Os pesos e as medidas.Porto
Alegre/Caxias do Sul :EST/EDUCS,1981
[4] Parte de
suas cartas foram publicadas em DEBONI,L.ª
Mérica.Caxias do Sul:EDUCS,1985.
[5] Memórias
de José Dall Acqua .IN:Costa Rovílio e Batistel Arlindo.Assim vivem os italianos .Religião ,música,trabalho e lazer.Porto
Alegre:EST/ F. G. Agnelli,1983.p.114
e seguintes.
[6] O homem
deve saber antes de tudo
trabalhar,no que for,desde pequeno!
Só depõe aptidão tivê-la escola!
In: BALEN ,Ítalo.Os pesos e as medidas.Porto
Alegre/Caxias do Sul :EST/EDUCS,1981
[7] ADAMI
João Spadari. História de Caxias do Sul
Caxias do Sul , Editora São Miguel,1972
[8] Mais
informações podem ser encontradas no trabalho de:COSTA,Rovílio.Fonti per lo
studio dell'emigrazione italiana in Brasile. IN:ALTREITALIE. Torino: Fondazione
Giovanni Agenlli N° 1, Ano 1 .Abril 1989
[9] Entre
outros os trabalhos de :LAZZAROTTO, Valentim. Pobres Construtores de Riqueza. Caxias do Sul: EDUCS, 1981. GIRON,
Loraine Slomp. As Sombras do Littorio: o fascismo no Rio Grande do Sul. Porto Alegre: Parlenda, 1994 IOTTI, Luiza
Horn. O Olhar do Poder. Caxias do
Sul:EDUCS,1998.
[10] O
vinho do saber é perigoso! Tomá-lo só com sede e vocação. In: BALEN ,Ítalo.Os pesos e as medidas.Porto
Alegre/Caxias do Sul :EST/EDUCS,1981
[11] Entre
outros :ZARDO,Maria de Fátima .Do outro
lado do rio.Família Dall'Onder -Memórias Bento Gonçalves:Arte e Texto,
1997.D ALL'ALBA.Pe. João Leonir .Os
Dall'Aba-cem anos de BrasilPorto Alegre/Caxias do
Sul:EST/EDUCS,1984.BRESOLIN,Luciano. Imigração italiana:Os Bresolin.Passo
Fundo: Pe.Berthier,1994 .
[12]
Trabalhar é o dever!Porque não criam Imposto para os que não fazem nada? In:
BALEN ,Italo.Os pesos e as medidas.Porto
Alegre/Caxias do Sul :EST/EDUCS,1981
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