quinta-feira, 25 de agosto de 2011

AS CASAS TÊM HISTÓRIAS (2)



Um cortile na atualidade.
Situado próximo de Pedavena .Itália
 Aqueles que não conhecem a Itália do Norte ,em sua zona  rural podem imaginar que a  região colonial italiana do Rio Grande do Sul   seja uma  cópia. Ao contrário,  nada é  mais diverso. Começa com a paisagem. A paisagem pré alpina e  alpina é inigualável. Dura,majestosa e distante lembra um  cartão postal lunar. O viajante  se sente  aplastado  pela sua beleza e  agressividade.Nada parecido com a amena  paisagem da  Serra cujos vales e matas  são  próximos e  agrestes.
     As diferenças não se restringem às paisagens. Elas se repetem nas pequenas vilas e cidades e ainda nas casas e  construções.As povoações povoadas por camponeses italianos  constituem um  habitat aglomerado ,onde os campos lavrados cercam as povoações  que se estendem   ao longo das estradas ,em  ocupação histórica .Resultam das relações  engendradas entre servos da terra e seus senhores ( que os imigrantes chamavam de condes) Dada sua condição servil  viviam próximos ,suas casas eram  encostadas umas nas  outras. Na região de Feltre e no Val Belluna  há um tipo de construção original  chamado de cortile  (ou cortivo).Os cortile reuniam  famílias extensas,avós, pais, filhos e netos vivendo juntos no mesmo lugar.Cada grupo nuclear de familia ocupava  uma só peça. Cada comodo tinha  uma porta que dva  acesso a   escadas externas. A longa  construção de alvenaria de um  a três  pavimentos  tinha  apenas uma cozinha, comum a todos os membros do cortile. Na cozinha comum, em   seu grande larin(lareira ) as mulheres da família extensa disputavam  o lugar hegemônico  .Nada mais sério  do que a disputa pelo poder na cozinha.Dele depende a melhor alimentação dos próprios  filhos e o controle dos gastos .O treinamento das noras se dava na cozinha com receitas e modos de preparar os alimentos.A entrada de um novo membro da família era assim um exercício de dominação e de subordinação. A terra era pouca, a comida escassa e o espaço ínfimo. Animais e homens disputavam o calor da cozinha,ou ,pior ainda  se aqueciam apenascom o calor dos  animais.
No Brasil, nas colônias da Serra   outra era a situação. As casas  em seu habitat disperso tinham espaço, as terras eram do tamanho dos condados italianos  e o domínio  da sogra limitava-se a um curto período de convivência comum,nos primeiros meses de casados.O confinamento acabara, e, cada família poderia   ter  sua própria  casa e fogão.O fogão no período imperial era tão importante que o imposto sobre a propriedade era calculado pelo número de fogoões existentes na propriedade .Era o chamado imposto focolar.  Para algumas noras o tempo de convivência com as sogras  era maior.O filho escolhido para dar  assistência aos pais idosos ficava morando com eles até a sua morte, quando,  em compensação herdaria a terra .As casas com seus porões frescos e amplos garantiam alimentação. Até os animais domésticos passaram a ter melhores acomodações. A simbiose entre  homens e animais definitivamente acabara .
Hoje os cortile na Itália servem de residências, restaurantes de luxo e  pousadas.Os tempos são outros e outros são os usos das casas Na Europa as coisas antigas são respeitadas e valorizadas .Já na colônia atual as casas antigas viram estábulo ,silo ou depósito de trastes velhos. Destruidas as casas antigas são construídas réplicas novinhas para representar as casas destruídas.Infelizmente ,O simulacro nunca poderá substituir o real.


Arsié .Italia .1965
 



As imagens   usadas no texto são do livro Coscienza e conoscenza dell’habitare ieri e domani organizado por Daniela Perco e outros Publicação da Província de Belluno s/d.



 




  


Desenho de Corrado Bosco, 1963.Cortile em Arsié


Um comentário:

  1. Como é bom ouvir (ou ler) histórias (reais) contadas por quem gosta da História.
    Bom te reencontrar, Loraine.

    Maria Nair

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